Saturday, December 30, 2006

Uma capa de Jorge Barradas

A Lã e a Neve
Lisboa, Guimarães & C.ª, 1947

Sunday, December 17, 2006

Castro para os mais novos

Não Há Borracha que Apague o Sonho
Luísa Ducla Soares (texto) e Danuta Wojciechoswska (ilustrações)
Sintra, Câmara Municipal, 2005

Monday, December 04, 2006

Uma capa de Roberto Nobre

Ferreira de Castro e a Sua Obra
(organização de Jaime Brasil)
Porto, Livraria Civilização, 1931

Friday, November 24, 2006

Milton Hatoum

O escritor brasileiro manuara Milton Hatoum foi o vencedor do Prémio PT de Literatura Brasileira, atribuído ao seu terceiro romance Cinzas do Norte. Leio no Público de hoje, na breve entrevista telefónica que lhe fez Andréia Azevedo Soares:
«Os meus livros passam-se em Manaus, que é uma cidade enorme com milhares e milhares de habitantes, assim como uma zona franca de produção poderosa para a economia do país. [...] O que escrevo poderia se passar noutras cidades, mas escrevo sobre aquilo que conheço -- não vou escrever sobre a floresta, aliás Ferreira de Castro já o fez muito bem em A Selva. Não sou índio. E tenho a certeza de que um dia os índios tomarão a palavra para contar a sua própria história.»

Sunday, November 19, 2006

Sunday, November 12, 2006

Uma antologia


No Afrodite, referência a uma antologia de referência.
Castro está representado com O Senhor dos Navegantes, que integra o volume A Missão (1954).

Thursday, November 09, 2006

Um poema de Fiama, a propósito

Fusos! Poderei invocar sob esse nome
as rochas harmoniosas, paisagem perdida:
entre prismas da neve, desfiladeiro distante.
Tal como eu, livros lamentam o encontro e a perda
dos viajantes. Até a passagem no meio dos abismos, garras
das pedras. No entanto estive naquela neve
que me cega. Porque só eu percorro o trilho irreversível
para regressar através dos vestígios. Para contemplar
o brilho desse tempo inóspito, com a imobilidade
específica. Quem se deslumbra naquele cerco,
garganta das rochas, traz o estigma. A narração
de viagens descreve tudo o que se reviu
e também o conflito entre isso, massas rochosas,
e o corpo presente. Nem a elegia me cabe
como herança de elegíacos, nem a memória me transpõe
para aí. Crio, para além da morte, enunciados
sobre novas visões do passado. Neve luxuriante,
quadrilátero da cripta recôndita, a rocha de ónix.










Fiama Hasse Pais Brandão, Novas Visões do Passado, Lisboa, Assírio & Alvim, 1975, p. 53

Wednesday, November 08, 2006

Gibraltar, 1939
(foto: Ferreira de Castro ou Elena Muriel)
A Volta ao Mundo,
Lisboa, Empresa Nacional de Publicidade, 1940-44, p. 10

Saturday, November 04, 2006

última epígrafe de A SELVA (Euclides da Cunha)


Realmente, a Amazónia é a última página, ainda a escrever-se, do Génesis
[Euclides, visto por Portinari]

Monday, October 30, 2006

Uma capa de Jorge Barradas

A Tempestade
Lisboa, Guimarães & C.ª, 1940

Monday, October 16, 2006

Uma epígrafe de A SELVA (De Pinedo)

Ser forçado a descer naquele horror, mesmo que se aterre incólume, é ficar onde se desceu e morrer sepultado na sombra.

Wednesday, October 04, 2006

Censura


Apreensão do romance de Jorge Amado, Gabriela, Cravo e Canela, por um agente da PIDE, numa livraria Lello de Sá da Bandeira.

Ferreira de Castro prefaciou esta edição portuguesa, em 1960, com a chancela das Publicações Europa-América.

Tirado do Blog da Sabedoria

Saturday, September 30, 2006

Terre Froide

Grasset, Paris, 2003
(tradução de Louise Delapierre, 1947)

Monday, September 25, 2006

Saturday, September 16, 2006

Uma entrevista



Fernando Dacosta entrevista Ferreira de Castro na esplanada da pastelaria «Veneza», na Avenida da Liberdade (1967)

Fonte: Fernando Dacosta, «Viver com gentileza -- Autobiografia», JL-Jornal de Letras, Artes e Ideias , Lisboa, 17 de Agosto de 2005, p. 36

Memória #2 - Fernando Dacosta com Castro e Assis na «Veneza»

Encontrava-me com Ferreira de Castro depois de almoço, na Veneza, pastelaria da Avenida da Liberdade. Assis Esperança era-lhe uma companhia diária, quase um «duplo» nas palavras, nas ilusões, nas ironias, nas fantasias. «Este café é um pouco a minha casa. Há anos, sempre que estou em Lisboa, que aqui venho.» Sereno, imperturbável, o autor de A Selva conversava por igual com quem se lhe sentasse à mesa, se lhe dirigisse na rua, o questionasse em conferências, o abordasse em livrarias. Ouvia, e fazia ouvir-se, sem esforço, sem enfado, fato e gravata cinzentos, chapéu na cabeça, imaginação na distância, bondade no coração.
[...] A meio da tarde, Ferreira de Castro levantava-se, subia a rua, chalaceava (quando a via, à passagem pelo Tivoli) com Beatriz Costa e, sempre a pé, sempre devagar, sempre afectuoso, rodava a Praça do Marquês de Pombal sumindo-se num pequeno hotel (onde se resguardava com a mulher, a pintora Elena Muriel) trocado frequentemente por Sintra. Em Sintra estão, aliás, o seu museu e as suas cinzas.

Fernando Dacosta, Nascido no Estado Novo, Lisboa, Editorial Notícias, 2001, pp. 186-187

Sunday, August 27, 2006

Saturday, August 26, 2006

Thursday, August 17, 2006

Legenda de «Carne Faminta»

«Se as aguias do pensamento não devoraram ainda o teu imundo coração, não te debruces sobre o enigma cruel destas paginas.»

Uma capa de Roberto Nobre

Carne Faminta
A Hora Novelesca, n.º 1,
Lisboa, Outubro de 1922

Friday, August 11, 2006


Obrigado
ao Riobaldo & Diadorim
pelo link.

Uma epígrafe de «A Selva» (Tavares Bastos)

A sensação de profunda melancolia que se apodera do espírito, nos adverte de que estamos dentro das mais densas solidões do Mundo. No Alto Amazonas, principalmente, domina esse amargo sentimento que obriga a alma a dobrar-se sobre si mesma.

Vale do Amazonas

Tuesday, August 08, 2006

Ferreira de Castro em Sines

Iniciativas em torno de "A Selva", de Ferreira de Castro .Apresentação do livro, exposição, sessão de cinema.CAS Agosto Para todosExposição "À Superfície do Tempo - Viagem à Amazónia"De 8 de Agosto a 8 de SetembroExposição produzida pelo CPF (Centro Português de Fotografia) com 53 fotografias (70x70 cm), de autoria de Duarte Belo, feitas em 2000, por ocasião das comemorações do quinto centenário da viagem de Pedro Álvares Cabral ao Brasil. Nestas fotografias o autor refaz, com a sua câmara, o itinerário vivido pelo escritor Ferreira de Castro, descrito em 1903 na sua obra A Selva
Ministério da Cultura / Centro de Português de FotografiaLivros em cima da mesa: "A Selva", de Ferreira de Castro11 de Agosto, 21h30
«... o clarão perdia terreno: já se via o bananal, apagavam-se, ao longe, os contornos da selva, o rio fundira-se na noite e os troncos cinzentos das três palmeiras começavam a vestir-se de luto. Quando chegasse a manhã, derramando da sua inesgotável cornucópia a luz dos trópicos, haveria ali apenas um montão de cinzas que o vento, em breve, dispersaria....»Apresentação do livro por Ricardo António Alves (Director da Casa Museu Ferreira de Castro de Sintra)Projecção do filme "A Selva", de Leonel Vieira9 e 16 de Agosto, 16h30
"A Selva" conta a história de Alberto, um jovem monárquico português refugiado no Brasil que vai trabalhar para a selva amazónica durante a febre do ouro negro. Ali, rodeado de perigos míticos, molda o seu carácter e conhece Dona Yá-Yá com quem mais tarde se vai envolver. Diogo Morgado e Maîte Proença dão corpo e alma aos protagonistas desta obra marcante da literatura portuguesa.

Quicklinks: Contactos, Horários e Outras Informações Como Chegar a Sines e ao Centro Mapa do Site Site do Centro de Artes de Sines, um equipamento da Câmara Municipal de Sines. (c) Câmara Municipal de Sines 2006 .

[estão todos convidados]

Sunday, August 06, 2006

Testemunhos #1 - Edmundo de Bettencourt: Ferreira de Castro e o neo-realismo


Na importante entrevista dada a Brito Câmara, a propósito da«novíssima geração» (a do neo-realismo), em face da precedente (a da presença, cronologicamente a mesma de Ferreira de Castro):

-- Quem é que, em Portugal, antes do aparecimento da actual geração, você entende estar mais próximo dela?

-- Aos novos de agora, alguns mais velhos se anteciparam. Uns, anteriormente, à margem de qualquer grupo literário ou artístico, mas esclarecidos por uma experiência de luta e de cultura, figuram hoje decididamente a seu lado com produções bem representativas da nova corrente, como Armindo Rodrigues e José Gomes Ferreira. Outros, por afinidades de atitude e conteúdo de algumas obras ou só em virtude deste último elemento, poderão ser colocados entre eles. Tal é o caso de Ferreira de Castro, acerca do qual, a leitura dos seus melhores romances, claramente nos elucida a este respeito. [...]
João de Brito Câmara, O Modernismo em Portugal (Entrevista com Edmundo de Bettencourt), edição fac-similada [1944] com prefácio de António Pedro Pita, Coimbra, Minerva, 1996, pp. 61-62
fotografia em Fado de Coimbra e...
Com pano para mangas, esta observação de Bettencourt, que separa «atitude» de «conteúdo», ou seja -- e descodificando esquematicamente: o comprometimento político obrigatório do neo-realismo com a doutrina comunista e soviética (a atitude) e uma literatura que espelha também as lutas sociais -- e aqui está a afinidade de conteúdo de Castro com a «novíssima geração» --, porém com um outro enfoque, que é, em suma o enfoque anarquista do escritor libertário.

Saturday, July 22, 2006

Outras palavras #1 - A arte moderna ante a sociedade actual (4)

Mas dir-me-ão que nada disso têm feito os artistas contemporâneos. Antes: que só têm feito arabescos, caprichos, bizarrias, exotismos. Tudo o que nos aparece pela primeira vez tem um ar de exótico. Quem não se sorrirá quando alguém afirmar que debaixo dos seus pés, trilhando um matagal, está um caminho? Quem não chamará a isso uma bizarria? E, todavia, se o matagal for desbravado, o caminho aparecerá. E principiará a ser uma coisa normal, uma odiosa coisa normal -- uma coisa para a maioria.
[...]
É isso que estão fazendo os artistas modernos -- os artistas da vanguarda. Deslumbrados pela luz, pela vertigem do século, mas aproximando-se da porta que dá para o futuro. Da porta para além da qual vive o espírito de amanhã.
Dir-me-ão que muitos não são sinceros. É verdade. Muitos não são sinceros! Muitos aproveitam-se da confusão desta hora em que vivemos, confusão de todas as horas de combate, para se fazerem passar como modernos, como precursores, eles que são nulidades!
[...]
Mas apesar de tudo eles não são absolutamente inúteis. A sua acção aumentará o tumulto, o ruído que é necessário fazer, para que a burguesia, para que as academias, para que os cadáveres animados saibam que há um mundo novo brotando das cinzas do mundo velho. Porque é preciso que se faça sobre a terra uma grande expectativa. Essa muda expectativa que precede os grande fenómenos.
Conferência proferida na Associação dos Empregados de Escritório, Fevereiro de 1926
In A Batalha -- Suplemento Semanal Ilustrado, n.º 118, 1 de Março de 1926, p. 6.
Juan Miró, Estátua, 1926
MoMA -- Museu de Arte Moderna, Nova Iorque

Sunday, July 16, 2006

Outras palavras #1 - A arte moderna ante a sociedade actual (3)

[...]
E digo um pouco de Beleza Nova, porque não creio que que a Beleza da Arte Moderna seja definitiva. Mas nem por isso a devemos considerar menos. Ela é a legenda do pórtico que dá para os maravilhosos jardins da Nova Renascença.
Os artistas modernos, são, é certo, elementos de intervalo -- desse intervalo que vai desde o crepúsculo de uma Arte até à alvorada duma outra.
Mas são eles também que preparam o ambiente para aqueles que hão-de vir gravar as novas lápides eternas.
Na inquietude que nos rodeia, na vibração que nos envolve, pressentem-se já os passos, ainda subtis, daquele que há-de demarcar para sempre os novos caminhos a trilhar. Daquele que há-de escrever a epopeia do espírito moderno. E será uma epopeia universal. Porque de universalismo está feita a Arte Moderna. Os escritores mais representativos da vanguar são escritores internacionalistas. Esse desdém que eles mostram pela chamada pureza do idioma, pela pontuação convencional e até pelas regras gramaticais, significa indiferença pela língua nativa, atitude que um clássico não teria, pois ela muito concorre para a desnacionalização dos motivos artísticos.
Procurai uma página de bom francês em Paul Morand, em Max Jacob, em Cocteau... Não a encontrareis.
Procurai uma pontuação regular em Apollinaire, em Reverdy, em Tzara... Não a encontrareis também.
-- Se para se escrever alguma coisa de novo for necessário escrever mal o nosso idioma, não se deve hesitar.
Este lema, adoptado por todos os escritores da vanguarda artística, leva-os à detruição desse convencional respeito que até hoje se tributava a essa coisa não menos convencional, que é um idioma. É dizer: leva-os a despedaçar uma das mais fortes couraças do nacionalismo.
E um espírito verdadeiramente moderno só pode ser um espírito verdadeiramente internacionalista. Um espírito ou uma obra artística.
(continua)
A Batalha -- Suplemento Semanal Ilustrado, nº 118, Lisboa, 1 de Março de 1926
desenho: Apollinaire por Picasso

Thursday, July 13, 2006

Outras palavras #1 - A arte moderna ante a sociedade actual (2)

Porque surgiu, porém a arte moderna? -- perguntar-me-ão.
Pela necessidade que o artista tem de ser original. O mundo e os espíritos dignos deste nome estavam saturados de processos antigos, de inúteis convencionalismos, de lugares-comuns. E se o mundo do século XX se transforma nas suas várias facetas, porque não se transformar também a Arte? A Arte do Passado, a arte-continuidade, só mui lentamente evoluía. As novas gerações, com a sua inquietude, abandonaram a evolução e fizeram a revolução.
Porque a Arte Moderna é isso -- é a revolução contra a evolução. As novas correntes estão para a Arte do passado, como ideal anarquista está para a Ditadura.
É preciso libertar o homem, como é preciso libertar a Arte, de fórmulas, de preconceitos. Porque a Arte está sempre, quer a burguesia artística o queira ou não, quer os próprios artistas o ignorem, ligada aos fenómenos sociais. A renovação artística contemporânea coincide com a renovação social que se adivinha.
E é precisamente por isso que a Arte Moderna irrita a burguesia. É uma arte que demanda novos caminhos, que ruma a novos continentes. Uma arte que vai em direcção ao Amanhã. Rompendo com o espírito do Passado, com a tradição, com tudo aquilo que sustenta ainda os pilares da sociedade actual. Caminhando para o espírito novo, para o espírito futuro, essa arte auxilia indirectamente, mas auxilia de facto, a formação duma nova sociedade. Porque só com um espírito novo se podem romper as velhas algemas.
(continua)
A Batalha -- Suplemento Semanal Ilustrado, n.º 118,
Lisboa, 1 de Março de 1926, p. 6.
Gravura: Thomas Hart Benton, Carta de Além-mar, National Gallery of Art, Washington

Sunday, July 09, 2006

Outras palavras #1 - A arte moderna ante a sociedade actual (1)

[fotografia de San-Payo]

O nosso colaborador e distinto escritor Ferreira de Castro realizou no passado Domingo, na Associação dos Empregados de Escritório, uma conferência subordinada ao tema «A arte moderna ante a sociedade actual».
É dessa conferência o excerto que se segue:
A Arte em todos os tempos teve a sua parte frívola e a sua parte profunda. Uma para a Eternidade, outra para o minuto que se esgota.
E a Arte Moderna possui também essa dupla face. Mas a frivolidade, o humorismo, a blague, constituindo uma corrente da Arte Moderna, não constituem a Arte Moderna em si. Se o riso é muitas vezes a mentira com que se dizem as grandes verdades, é também certo que não é de riso mas sim de profunda expectativa essa atitude de quem ausculta o coração do homem, o coração duma época, o coração do mundo.
E seria grotesco que para sondar a nossa época, tivéssemos de gargalhar ou de recorrer aos processos artísticos do Passado.
Só um espírito superficial pode confundir uma das muitas correntes da Arte Moderna com a orientação do conjunto.
Mas na realidade essa confusão dá-se no espírito da maioria.
Os amantes dos processos arcaicos -- chamemos-lhes misericordiosamente amantes -- nada definem do que seja moderno: englobam personalidades, correntes diversas, técnicas individuais, sob esta terrível legenda: Arte moderna, arte de Fantoches, arte execrável...
E já que não a podem compreender, procuram olvidá-la ou empenham-se em detractá-la.
Isto aconteceu com todas as renovações artísticas e sociológicas.
-- Loucos! Loucos! -- exclamam os velhos bonzos, desde a quietude de suas peanhas.
Mas o mundo segue a sua rota incognoscível e os loucos de ontem são os génios de hoje -- os precursores de sempre.
(continua)
A Batalha -- Suplemento Semanal Ilustrado, n.º 18,
Lisboa, 1 de Março de 1926, p. 6.

Acerca do Repórter X,

















Castro escreve uma extraordinária carta a Natália Correia, no Abencerragem.

Sunday, June 18, 2006

A propósito de «Última dádiva», de Trindade Coelho


Causa-nos sempre grande impressão tomarmos consciência de que uma criança com onze anos e meio -- a idade que tinha Ferreira de Castro quando chegou a sua vez de partir -- tenha emigrado sozinha para o Brasil, (mal) confiada a um vago parente. Muitas crianças, porém, estiveram na mesma situação, entre meados do século XIX e as primeiras décadas da centúria seguinte. Algumas delas lograram ter também um percurso literário. Foi o caso de Francisco Gomes de Amorim (1827-1891) ou de Miguel Torga (1907-1995).
Trindade Coelho (1861-1908) transmite-nos essa angústia num belíssimo conto de Os Meus Amores (1891), intitulado «Última dádiva», mostrando-nos o sofrimento de um pai quando as despedidas se avizinham:
«--Pois são horas de largar, Sr. José, isto vai pràs duas. Não tarda que comece a amanhecer. -- E como estavam à porta de casa: -- Será bom acordar já o pequeno: veste, não veste, é tempo que se vai. -- Iam à vela se o tempo não mudasse. Era bom aviar, por isso.
Mas, à ideia de ter de acordar o pequeno, o José Cosme deixou-se cair pelo banco que estava debaixo do alpendre e desatou a chorar violentamente.
O barqueiro tentou animá-lo, constrangido:
-- Então, Sr. José?... O chorar é lá para as mulheres! Olhem agora que homem! -- E tentava levantá-lo, pô-lo de pé. -- Limpe lá essas lágrimas que vai afligir o pequeno! Ou quer que ele vá a chorar todo o caminho?
O Cosme fez que não com a cabeça, violentamente, e pôs-se a enxugar os olhos com a manga da camisa.
-- Pois então levante-se lá. -- E segurou-o com força por baixo dos braços. Assim! Lá porque o pequeno vai para o Brasil, não fique vossemecê a pensar que o não torna a ver!
Mas era isso mesmo o que ele pensava...
-- Porque não sei que me adivinha que não torno a ver o pequeno! -- concluiu a chorar o José Cosme.
-- Cismas!, lembranças que vêm à gente quando está aflita. Mas há-de vê-lo que o não há-de conhecer, digo-lho eu! Mais ano mesmos ano, aparece-lhe aí rico...
"Rico! Bem lhe importava a ele que o pequeno viesse rico! O que desejava era que voltasse e que ele ainda fosse vivo só para o abraçar."
[...]
O José Cosme acendeu então a candeia, receoso de que a luz o acordasse, e achegando-se do filho pôs-se a escutar-lhe a respiração. Dormia!... Mas brandamente pousou-lhe a mão sobre a cabeça, e chamou baixinho, quase ao ouvido, beijando-o, sobressaltado, como se fosse praticar um grande crime:
-- Filho, olha que são horas, meu filho...»
Trindade Coelho, Os Meus Amores, 3.ª edição, Mem Martins, Publicações Europa-América, s. d., pp. 60-62.

Thursday, June 15, 2006

«Salazarquia»


«O escritor Ferreira de Castro, bem qualificava o modelo da salazarquia, ao dizer que o regime do Estado Novo é um permanente inimigo da inteligência nacional... as ditaduras, por muito que durem, são um regime sem futuro.»
José Adelino Maltez n' O Tempo que Passa do último dia 8.

Saturday, June 10, 2006

A canção das águas, de Rebelo de Bettencourt

A CANÇÃO DAS ÁGUAS

A Assis Esperança e a Ferreira de Castro

Cantam as águas p'la ribeira fóra,
Cantam as águas numa voz magoada...
E eu não entendo esta canção molhada
Que me perturba e me enternece agora!

Pela ribeira vão cantando as águas,
Cantam as águas de maneira nova...
-- Quem foi o poeta que inventou a trova,
Que as águas cantam, repetindo as máguas?

Cantiga assim não tinha ouvido ainda,
Nem sei até se outra mais linda existe!
Por sêr tam linda é que a cantiga é triste!
-- Por sêr tâm triste é que a cantiga é linda!

As águas cantam de maneira nova...
Oiço uma voz nas águas da ribeira...
--Quem foi que disse pela vez primeira
A soluçante e perturbada trova?

Quem a inventou, tam magoada e calma,
E quem a disse pela vez primeira?
--Quem deu voz às águas da ribeira
E com a voz lhe deu tambem a alma?

Alma das águas sobre as águas indo,
Ó alma errante, qual o teu segredo?
--Oiço a cantiga de mistério e mêdo
E a sua dor vai dentro de mim caindo!

Dentro das águas chora a voz de alguem,
Chora uma voz errante e sem destino...
Em vão quero entendê-la, e nunca atino
Com o sentido que a cantiga tem!

Linda cantiga de misterio e dor,
Não sei tirar-te já do meu sentido!
-- Que estranhos ritmos que eu não tinha ouvido!
-- Que lindos versos que eu não sei compôr!

Quem te inventou, linda cantiga de água?
Quem te inventou assim tam linda e triste?
Em ti uma alma incompreendida existe,
Que eu bem na oiço em tua voz de mágoa!

Canção de dôr toda molhada em pranto,
Quem é que sabe o teu mistério fundo?
Parece até que vem dum outro mundo
A tua voz que me perturba tanto!

Vaga e distante esta canção molhada
Enche a minha alma de mistério e mêdo...
Cantiga errante, qual o teu segredo?
Quem é que chóra em tua voz magoada?

Pela ribeira vão cantando as águas,
Cantam as águas de maneira nova...
-- Quem foi o poeta que inventou a trova
Que a ságuas cantam, repetindo as máguas?

Rebelo de Bettencourt, Oceano Atlantico, Ponta Delgada, Tipografia Insular, 1934, pp. 13-16

Thursday, June 01, 2006

Doçura sem candura

Cândido Portinari está em destaque no blogue O Século Prodigioso , a que este lugar castriano se associa.

Portinari foi um dos grandes intérpretes de
A Selva, transbordando o seu enorme talento
num texto caudaloso, espesso e poderoso ,
como um braço do próprio Amazonas...

Friday, May 26, 2006

Entrevista a A. Lopes de Oliveira (5)

-- Usa estimulantes para escrever?
Ferreira de Castro sorveu um gole de café e depois de avivar o cigarro que pendia dos lábios, respondeu-nos:
-- Sim. Café e cigarros.
-- Prefere o campo para o seu trabalho?
-- Sim, sempre o Campo. Mas, infelizmente, é quase sempre na Cidade que construo o trabalho.
-- Prefere poesia ou prosa?
-- Gosto das duas coisas. Para eu escrever, o romance; para eu ler, a filosofia.
-- Já alguma vez escreveu para o teatro?
-- Quando tinha vinte anos fiz algumas tentativas para esse fim, mas depois desisti disso.
Foi com estas palavras que a conversa se encerrou.
Eram 6 horas da tarde: tinha chegado o momento para Ferreira de Castro realizar o seu trabalho quotidiano. Puxou pelo relógio, viu a hora e disse-nos:
-- Tenha paciência, vou a o meu trabalhinho. É o meu pão-nosso de cada dia.
Apertou-nos a mão e seguiu lentamente a Avenida da Liberdade.

A. Lopes de Oliveira, Como Trabalham os Nossos Escritores, Lisboa, Editorial Proença, 1950

Autores entrevistados: Acúrcio Pereira, Amadeu de Freitas, Assis Esperança, Aurora Jardim, Correia Marques, Eduardo Schwalbach, Ferreira de Castro, Guedes de Amorim, Hernâni Cidade, Hugo Rocha, Joaquim Paço d'Arcos, Luís de Oliveira Guimarães, Gustavo de Matos Sequeira, Moreira das Neves, Mota Júnior, Natércia Freire, Norberto Lopes, Ramada Curto, Ribeiro Couto e Virgínia Vitorino.

Thursday, May 25, 2006

108

José Maria Ferreira de Castro nasceu nesta casa, propriedade dos patrões dos seus pais, faz hoje 108 anos.

O ano de 1898 (1)

A 24 de Maio de 1898, no lugar dos Salgueiros, freguesia de Ossela, concelho de Oliveira de Azeméis e distrito de Aveiro, nasce José Maria Ferreira de Castro, primeiro filho de José Eustáquio Ferreira de Castro e Maria Rosa Soares de Castro, camponeses.
«Para mim, a aldeia em que nasci não é apenas a infância que nela me decorreu, incompreendida e triste, é também a poesia que já então lhe captava, a poesia que ela tinha, mais tarde inflamada por aquela de que eu mesmo a impregnei. Poesia que tantas vezes me tira a lembrança dos dias infantis, para recordar apenas o encanto da Natureza, que eu não consegui evocar, lá longe, nas ardentes paragens do exílio, sem fervor e sem desespero.»
«A aldeia nativa», Os Fragmentos, 2.ª ed., Lisboa, Guimarães & C.ª [1974], p. 46.

Entrevista a A. Lopes de Oliveira (4)

-- Possui ficheiro?
-- Não. Não possuo.
-- Tem método no trabalho?
-- Tanto quanto possível. O trabalho intelectual, como sabe, não pode ser feito com a rigidez de outros trabalhos.
-- Escreve à máquina?
-- Não. À mão. Mando dactilografar e depois revejo. Em seguida, torno a corrigir duas, três e mais vezes.
-- Claro que fica a forma definitiva?
-- Nalgumas páginas, sim. Mas em muitas outras ocasiões essas provas são ainda corrigidas.
(continua)
A. Lopes de Oliveira, Como Trabalham os Nossos Escritores, Lisboa, Editorial Proença, 1950

Wednesday, May 24, 2006

Notícia antiga

Ainda não me habituei a este blogue temático. Por isso só hoje noticio o que teria sido oportuno há uns dias atrás: no passado sábado, dia 20, o Prof. Luís Manuel de Araújo, pioneiro da egiptologia em Portugal e seu nome mais destacado, esteve no Museu Ferreira de Castro, no âmbito das «Conferências no Museu», para falar da forma como o escritor viu e sentiu o país dos faraós. De três textos possíveis, dois canónicos e um da chamada «primeira fase» (pré-Emigrantes), o egiptólogo abordou uma noveleta publicada na revista ABC no último trimestre de 1923, folhetim intitulado «A Vingança do Pharaó», contemporâneo do achado de Howard Carter, texto desconhecido da generalidade dos leitores; seguiu-se a análise do ensaio d'As Maravilhas Artísticas do Mundo (1959-1963) no que respeita aos testemunhos egípcios. Por falar, e guardado para posterior artigo, ficaram as notas de viagem de Pequenos Mundos e Velhas Civilizações (1937-1938).
Entre um e outro texto, do folhetim eivado de egiptomania da juventude ao sereno percurso pelas maravilhas artísticas do país do Nilo, medeiam cerca de quarenta anos. Ter lá estado fez toda a diferença.

Tuesday, May 23, 2006

Entrevista a A. Lopes de Oliveira (3)

-- Qualquer hora lhe serve para trabalhar?
-- Não senhor. Em geral trabalho de manhã, até à hora do almoço. E, de tarde, das 17 ou 18 horas até ao jantar.
-- Mas prefere trabalhar a determinada hora?
-- Sim. Coisas de especulação intelectual prefiro fazê-las de manhã. Coisas quentes, como direi, sensuais, de tarde. Porque de tarde há mais voluptuosidade.
-- Por vezes não se sente incapacitado para o trabalho intelectual?
-- Muitas vezes se não se está incapacitado, não se está em estado propício.
(continua)
A. Lopes de Oliveira, Como Trabalham os Nossos Escritores, Lisboa, Editorial Proença, 1950.

Monday, May 22, 2006

Entrevista a A. Lopes de Oliveira (2)

-- Como trabalha?
A resposta não se fez esperar. Ferreira de Castro poisou a chávena de café e, tirando uma longa fumaça, disse-nos:
-- Gosto de trabalhar num ambiente de pura tranquilidade, porque assim posso mergulhar melhor no trabalho que realizo.
E acrescentou, num desabafo natural:
-- Ambicionava trabalhar à sombra duma frondosa árvore amiga, num sítio solitário, longe dos bulícios. Mas, impossível!
Ferreira de Castro acrescenta ainda:
-- E integro-me de tal forma no trabalho que estou a viver, que me esqueço de tudo e de todos.
E, a propósito, contou-nos um dos mais curiosos pormenores da sua vida laboriosa:
-- Uma vez estava a trabalhar num hotel em Nova-Iorque. De súbito, desenrolou-se uma horrível tragédia, um incêndio, cujas labaredas lambiam sofregamente parte do edifício. Minha mulher que estava num quarto ao lado assustou-se e chamou por mim, e disse-me aflitivamente o que se passava. Embora ela falasse comigo muito a sério, eu respondi-lhe automaticamente. Foi necessário ela repetir que havia um incêndio para eu despertar do meu alheamento.
(continua)
A. Lopes de Oliveira, Como Trabalham os Nossos Escritores, Lisboa, Editorial Proença, 1950.

Sunday, May 21, 2006

Entrevista a A. Lopes de Oliveira (1)

Na «Pastelaria Veneza», à Avenida da Liberdade, costumam reunir-se alguns homens de letras e jornalistas. Entre eles avulta Ferreira de Castro -- o escritor português cujos romances estão dando a volta ao Mundo.
Quem veja a figura desafectada de Ferreira de Castro, não adivinhará, por certo, que ela oculta na sua modéstia, simpática e afectuosa, um prosador de garra e um novelista de renome, já hoje, universal.
Pois foi ali, na «Veneza», que nós, naquela tarde, encontrámos o escritor. Nesse dia, estava sozinho, tirando longas fumaças do seu cigarro, com o olhar perdido -- quem sabe? -- nas recordações da floresta amazónica.
Sentámo-nos, junto dele, e conseguimos distraí-lo e trazê-lo às realidades da vida europeia.
Ferreira de Castro evocou-nos alguns episódios da sua aventurosa vida, através do mundo, e, foi depois disto, que a entrevista surgiu naturalmente, como a propósito da conversa que ele mesmo trouxera à baila.
Perguntámos-lhe então:
(continua)
Como Trabalham os Nossos Escritores, Lisboa, Editorial Proença, 1950

Na esplanada da «Veneza»

Ferreira de Castro e Roberto Nobre
Avenida da Liberdade, Lisboa
(foto s. d., anos 30)

Tuesday, May 09, 2006

Saturday, May 06, 2006

Imigrantes portugueses no Rio de Janeiro
emigrantes italianos a bordo
Emigrantes húngaros, 1920

Wednesday, May 03, 2006

Uma capa de Stuart

Emigrantes, 1.ª edição
Lisboa, Livraria Renascença, 1928

Sunday, April 30, 2006

Ir estando

Um blogue para ir estando com o autor de A Selva.